Por unanimidade de votos, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a natureza de litisconsórcio à posição ocupada pelos credores de sociedade em processo falimentar e aplicou a regra do artigo 191 do Código de Processo Civil de 1973 (CPC/73), que confere prazo em dobro para recorrer às partes representadas por procuradores distintos.
O caso envolveu uma ação de falência. A apelação não foi recebida porque os embargos de declaração interpostos contra a sentença que encerrou o processo falimentar foram considerados intempestivos.
Contra a decisão que não recebeu a apelação, os credores habilitados no processo de falência interpuseram recurso especial sob o fundamento de violação do artigo 191 do CPC/73 e do artigo 189 da Lei 11.101/05. Para eles, diante da existência de mais de um credor habilitado no processo falimentar, representados por patronos diversos, deveria incidir a regra que concede prazo em dobro para interposição de recursos.
Execução coletiva
A relatora no STJ, ministra Nancy Andrighi, deu provimento ao recurso. Segundo ela, tanto a doutrina quanto a jurisprudência consideram a falência um instituto processual de natureza de execução coletiva ou concursal. Dessa forma, tratando-se de processo executivo – disse a ministra –, o STJ já teve a oportunidade de se manifestar no sentido de que os credores que participam de concurso de preferências são considerados litisconsortes.
Nancy Andrighi lembrou ainda que a Lei de Falências e Recuperação de Empresas prevê expressamente, em seu artigo 94, parágrafo 1º, que, havendo reunião de credores, a fim de se obter o limite mínimo exigido para requerimento da falência do devedor (40 salários mínimos), estes assumem posição de litisconsortes.
Razoabilidade
A ministra reconheceu que a Lei 11.101/05 não possui disposição específica a respeito da natureza da posição ocupada pelos credores do falido e nem estabelece se o prazo para manifestação, quando houver partes representadas por procuradores diferentes, é simples ou em dobro. No entanto, disse não ser razoável concluir que os credores, que ao requererem a falência do devedor ostentavam (ou poderiam ostentar) posição de litisconsortes, percam tal condição a partir do momento em que a falência é decretada, sob risco de se criar grave insegurança jurídica.
O modo como a falência foi requerida, se conjuntamente ou não, também não afasta a natureza jurídica de litisconsortes dos credores, segundo Nancy Andrighi. “Para a configuração do litisconsórcio, basta a existência de comunhão, conexão ou afinidade de interesses, obrigações ou direitos relativos à demanda, circunstância facilmente verificável em situações como a que se apresenta na espécie”, disse.
No entendimento do colegiado, como a fruição do prazo em dobro consiste em benefício garantido às partes pela legislação processual, e não havendo disposição específica em sentido contrário na lei especial, deve-se reconhecer sua incidência no particular.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.634.850 – RJ (2015/0227516-0)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : SUZANO PAPEL E CELULOSE S.A
RECORRENTE : FIBRIA CELULOSE S/A
ADVOGADOS : ALFREDO DOMINGUES BARBOSA MIGLIORE – SP182107
CLAUDIA REGINA FIGUEIRA – SP286495
MARINA MENDES – SP330812
RECORRIDO : CLICKPAPEL DISTRIBUIDORA DE PAPEL LTDA – MASSA
FALIDA
REPR. POR : EDISON ROCHA DA SILVA – ADMINISTRADOR
ADVOGADO : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS – SE000000M
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. DIREITO FALIMENTAR E PROCESSUAL
CIVIL. CREDORES HABILITADOS. DIFERENTES PROCURADORES. ART. 191
DO CPC/73. PRAZO EM DOBRO PARA RECORRER. APLICABILIDADE.
1- Ação distribuída em 14/11/2006. Recurso especial interposto em
24/4/2015 e atribuído à Relatora em 25/8/2016.
2- O propósito da presente irresignação é definir se o prazo recursal dos
recorrentes (credores habilitados no processo de falência do recorrido) deve ser contado
em dobro, conforme regra do art. 191 do CPC/73.
3- A norma precitada dispõe que, de modo geral, conta-se em dobro os
prazos para falar nos autos quando, no processo, houver litisconsortes representados por
diferentes procuradores.
4- Tanto na doutrina quanto na jurisprudência, é indene de dúvidas que a
falência consiste em instituto processual cuja natureza jurídica é de execução coletiva.
5- Tratando-se de processo executivo, há precedente desta Corte
reconhecendo que credores que participam de concurso de preferências são considerados
litisconsortes.
6- A Lei de Falências e Recuperação de Empresas, outrossim, prevê
expressamente, em seu art. 94, § 1º, que, havendo reunião de credores, a fim de se obter o
limite pecuniário mínimo exigido para requerimento da falência do devedor, aqueles
devem ser considerados litisconsortes.
7- Nesse contexto, e à míngua de disposições específicas na LFRE em
sentido contrário, deve ser reconhecida a incidência da norma do art. 191 do CPC/73 para
a prática de atos processuais pelos credores habilitados no processo falimentar quando
representados por diferentes procuradores.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso especial e
dar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros
Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e
Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 20 de março de 2018(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora
Fonte: STJ – Superior Tribunal de Justiça